sábado, 13 de fevereiro de 2016

REVOLTA E NOVO ACORDO SOCIAL




Se a classe média foi uma das beneficiadas por décadas de crescimento económico, agora vê-se sozinha como a grande prejudicada por oito anos de recessão e de estagnação.

A classe média foi a grande beneficiada por cinco décadas de crescimento do ocidente. A consolidação da sua importância política e económica dá-se depois da segunda guerra mundial, em grande parte graças ao papel que o Estado assume como fiel duma balança que tem no outro prato os grandes detentores de riqueza.

O mundo entrou no século XX com a constatação clara das tensões que os desequilíbrios sociais podiam provocar. A revolução bolchevique e a posterior consolidação da União Soviética terão detonado sérios alertas nas grandes praças e, passada a instabilidade geoestratégica das duas guerras, havia que lancetar abcessos sociais. O Estado foi o grande agente dessa mudança, assumindo um novo acordo social que já não era apenas de soberania popular, mas também de concertação e justiça social, assente na redistribuição dos recursos. 

A Social-Democracia, enquanto síntese que procura fundir individualismo com mutualismo, é a grande inovação ideológica do século XX e é vencedora clara do período que vai de 1945 a 1989. Seguiu-se a globalização, com a subsequente cada vez mais fácil circulação de bens e capitais, o que terá dificultado o papel socialmente regulador dos Estados, tornando-o impossível quando as relações entre os poderes económico e político atingiram níveis de promiscuidade que já não podiam ser ocultados.

Se a classe média foi uma das beneficiadas por décadas de crescimento económico, agora vê-se sozinha como a grande prejudicada por oito anos de recessão e de estagnação. Veja-se o caso de Portugal: analisadas as opções orçamentais do anterior e do atual governo, não há sombra de dúvida de que foi e será esta classe a que mais pagou e continuará a pagar os custos do ajustamento financeiro e das aventuras privadas.

As estatísticas são claras: O último estudo do Credit Suisse revelou que o mundo chegou ao dealbar de 2015 numa situação em que os 1% mais ricos têm tanto como os restantes 99% da população.

É esta erosão social que explica o crescimento da esquerda urbana e não proletária, onde se acantonam as camadas intermédias duma classe que se sente cada vez mais ameaçada. Temos aqui a génese de partidos como o Syriza na Grécia, o Podemos em Espanha, o Bloco de Esquerda em Portugal, e também do surpreendente sucesso da candidatura de Bernie Sanders nos Estados Unidos e, num aparente paradoxo, dos êxitos de Donald Trump ou Marine Le Pen.

A revolta da classe média, que além de mais é justa, exige medidas de fundo e com carácter de urgência, sob pena de estar ameaçado todo um edifício de direitos, que é o grande legado do cristianismo, que foi modulado pelos iluministas e que consolidou a sua vertente social após a segunda guerra mundial, graças a ideologias redistributivas como a social-democracia ou a democracia cristã. 

Se queremos continuar a viver deste legado, não há como ficar calados. Precisamos urgentemente dum Novo Acordo Social e com repercussão planetária.


Luís Novais

Foto: Lacomunal

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